segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

O Primeiro Genocídio Alemão.

Hererós, as primeiras vítimas do racismo alemão.

Moas Herers abertura
Moças Hererós - Dias Atuais
Quando os alemães nazistas de Adolf Hitler começaram a matar em escala industrial judeus, ciganos, homossexuais, comunistas e todos os que os incomodavam, não eram novatos no assunto já tinham até prática. Eles já haviam feito antes, fora do olhar da Europa, longe de jornalistas, sem uma guerra formal declarada.

Quando Adolf Hitler era um adolescente, o Império Alemão tomou posse da Namíbia.

A Namíbia:

Mapa da Namibia
Namíbia - África
A hoje República da Namíbia é um país do sudoeste  africano limitado a norte por Angola e pela Zâmbia, a leste e a sul pelo Botswana, a sul pela África do Sul e a oeste pelo Oceano Atlântico.
 
Os primeiros a desembarcar e explorar a costa da Namíbia foram os navegadores portugueses Diogo Cão em 1485 e Bartolomeu Dias em 1486, mas a região não despertou interesse algum, nem ao menos fincaram bandeira ou foi reclamada pela coroa portuguesa.
Até recentemente pouco ou quase nada se sabia sobre a história da Namíbia de 1485 até 1885 até que a Conferência de Berlim, concedeu a Alemanha o direito de administrar o território do Sudoeste Africano; salvo um ou outro livro sobre história da África ou tratados de geografia. É fácil de explicar: A Namíbia é basicamente um deserto desolado.
Povo Herer, foto antiga
Povo Hereró
 
Até a chegada dos alemães em 1885 a região era habitada por dois povos: os Hererós e os Namaquas (também chamados de Nama). A Namíbia é basicamente um deserto, com o deserto do Namibe ocupando a maior parte de seu território (junto a costa), e o deserto do Kalahari no interior. Seus habitantes eram em geral pastores de gado.

Um Pouco de História:

Entre 1880 e 1914 ocorreu o momento histórico conhecido como a Partilha da África, também conhecida como a Corrida a África ou ainda Disputa pela África, que consistiu em reivindicações por parte de alguns países o direito de invadir e anexar regiões da África durante o período do neoimperialismo; envolveu principalmente: França e Inglaterra, embora também a Itália, Bélgica, Alemanha, Portugal, Espanha e, em menor proporção Estados Unidos, (o EUA, participou da fundação da Libéria). Para tentar minimizar qualquer eventual hostilidade entre esses países foi proposta por Portugal a Conferência de Berlim que acabou sendo  realizada entre 19 de Novembro de 1884 e 26 de fevereiro de 1885 nesta conferência ficou acertada a partilha da África entre as novas potências coloniais. Essa vergonhosa partilha que nunca deveria ter existido, é uma nódoa na história de todos os países participantes e foi executada de forma abjeta e resultou numa divisão que não respeitou, nem a história, nem as relações étnicas e mesmo familiares dos povos do continente africano. Haviam tribos isoladas é verdade e terras praticamente desabitadas; porém também haviam nações inteiras, étnicas, culturais e organizacionais, eram nações inclusive com demarcações geográficas como a nação do Congo por exemplo.
 
Assim nessa infame conferência ficou decidido em agosto de 1884 que a Alemanha seria a “dona” da Namíbia sob a forma de “protetorado”.
 
Desde o início houve resistência por parte da população local, os chamados Khoikhoi (devido a religião que praticavam) à ocupação alemã. Pegaram em armas para combater os invasores e uma paz tênue foi declarada em 1894.
Povo namaqua
Povo Namaqua
 
Os alemães iam  para lá para começar uma vida nova, tornarem-se fazendeiros etc. Porém as terras férteis eram raras e já ocupadas pela população nativa local, os Hererós e os Namaquas, afinal eles a conheciam, pois eram em sua maioria pastores e sabiam onde levar seu gado para pastar e sendo esses locais raros dado a característica desértica do país os alemães tinham que dar um jeito de expulsar os hererós e namaquas.
Theodor Gotthilf Leutwein
Theodor Gotthilf Leutwei
Governador da Namíbia
 
Em 1894, Theodor Gotthilf Leutwei tornou-se governador da Namíbia, que passou por um período rápido de desenvolvimento, e no mesmo ano a Alemanha enviou a Schutztruppe, ou as tropas coloniais imperiais, para pacificar a região; isso em pleno período de paz ainda que frágil.
 
De 1894 a 1904, os alemães foram encorajados a se estabelecer em terras tomadas dos nativos, o que obviamente causou um grande descontentamento. A terra e o gado que foram essenciais para os estilos de vida Hererós e Namaquas foram roubados pelos alemães. Os nativos foram usados como escravos e suas terras frequentemente eram “apreendidas” e entregues a colonos.
Schutztruppe
Schutztruppe Alemã

Uma pequena pausa para um esclarecimento importante:

Muitas vezes é usado como desculpa para as atrocidades cometidas pelos alemães, a grande quantidade de diamantes e outros minerais encontrados na Namíbia, o que é inteiramente mentira pois esses minerais só foram descobertos no local em 1908 e a maldade alemã começou como estamos vendo aqui mais de dez anos antes.
 
Entre 1894 e 1902 os hererós cederam mais de um quarto de suas terras para os alemães.
 
Durante os anos de invasão, os hererós se deixaram seduzir por produtos industrializados vendidos por comerciantes alemães; totalmente despreparados no trato com dinheiro, os hererós pediam empréstimos aos comerciantes, para gastar o dinheiro nos mesmos comércios onde pediam emprestado; é óbvio que não conseguiam pagar.
 
Os comerciantes começaram a cobrar os empréstimos, como não havia dinheiro, os comerciantes começaram a apreender o gado dos hererós, ou quaisquer objetos de valor que eles pudessem tomar, a fim de “amortizar” os empréstimos.
 
Para “resolver” o problema, o governador Leutwein decretou em 1902 (o ano carece de confirmação), que todas as dívidas não pagas seriam anuladas no ano seguinte (1903, carece de confirmação) o que na prática, se tornou uma manobra para que os comerciantes cobrassem as dívidas por conta própria, não respeitando o perdão da dívida. Os hererós iam de boa fé reclamar com os funcionários públicos do governo alemão, quando descobriram que esses funcionários eram cúmplices do esquema.
hendrik witbooi
Hendrik Witbooi
 
Em 1903, algumas das tribos Namaquas revoltaram-se, liderados por Hendrik Witbooi, onde cerca de 60 alemães morreram.
Em janeiro de 1904 os Hererós se juntaram aos Namaquas nas revoltas.
 
Começou a discussão sobre a possibilidade de criar reservas e forçar os Hererós a viverem nelas. Outros alemães eram a favor de simplesmente usar os hererós como escravos em suas fazendas e ainda outros eram a favor do extermínio de todo o povo hereró e namaqua.
 
Um ataque de uma grande tribo hereró foi feito contra os alemães; os hererós perderam a “batalha”; quem sobreviveu foi obrigado a entregar suas armas.
 
Os alemães ficaram tão confiantes com a vitória, que acreditaram que não haveriam mais ataques por parte dos hererós, e o governador Leutwein retirou a metade das tropas alemães da colônia.
Samuel Maharero
Chefe Samuel Maharero
 
No entanto em 1904 os hererós se revoltaram mais uma vez, liderados pelo Chefe Samuel Maharero, 120 alemães foram mortos, incluindo mulheres e crianças, e suas fazendas foram queimadas. Os rebeldes cercaram a localidade de Okahandja e fecharam os caminhos até Windhoek, a capital da colônia alemã.
 
Em  3 de maio de 1904 o Governador Leutwein foi forçado a pedir reforços a capital alemã, Berlim. Assim o Tenente-General Lothar von Trotha foi nomeado Comandante em Chefe da África do Sudoeste Alemão (Namíbia), chegando em 11 de junho com sua força de 14.000 soldados profissionais.
 
Começou uma briga dentro do poder alemão na colônia: O Governador Leutwein que era civil, era subordinado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros Coloniais Alemão, e relatou ao chanceler germânico Bernhard von Bülow, que queria derrotar os rebeldes Hererós mais aguerridos e negociar uma rendição com o restante deles para alcançar uma solução política.
 
Trotha que era militar, por outro lado, relatou ao Estado-Maior Alemão, que só era subordinado ao Kaiser Guilherme II e que queria esmagar toda e qualquer resistência nativa.
O General Lothar von Trotha venceu a contenda e partiu para a batalha contra os hererós.
kaiser wilhelm
Kaiser Guilherme II
 
Em  em 11 e 12 de agosto de 1904 aconteceu a Batalha de Waterberg onde Trotha e suas tropas derrotaram entre 3.000 e 5.000 hererós. Os hererós mesmo derrotados continuaram eventualmente a atacar pontos isolados de instalações alemães e algumas fazendas. Mesmo lutando bravamente os hererós não tinham mais condições de manter uma luta com os soldados profissionais alemães; e os sobreviventes da Batalha Waterberg retiraram-se para Bechuanalândia que era território dominado pelos ingleses (atual Botswana). Os ingleses acolheram os sobreviventes hererós com a única condição de não continuarem as hostilidades em território dominado por eles.
 
Outros 24.000 hererós (número aproximado) conseguiram fugir para o deserto do Kalahari, na esperança de alcançar o protetorado britânico. Quase todos morreram de sede. Patrulhas alemães encontraram mais tarde, esqueletos dentro de buracos de até 50 metros de profundidade; foi uma tentativa desesperada dos hererós encontrarem água.
 
Samuel Maherero e 1.000 de seus homens conseguiram cruzar o Deserto do Kalahari até a Bechuanalândia.
Em 2 de outubro, o Tenente-General Lothar von Trotha lançou um aviso aos hererós:
 
“…Eu, o grande general das tropas alemãs, envio esta carta ao povo Hereró … Todos os hererós devem deixar esta terra …Qualquer Hereró encontrado dentro das fronteiras alemãs, com ou sem uma arma, com ou sem gado, será morto. Vou deixar de receber todas as mulheres ou crianças, vou expulsa-los (as mulheres e crianças) ou  serão eles mortos. Esta é a minha decisão para o povo Hereró…”
 
Sem conseguir uma vitória conclusiva através da batalha, o General Trotha ordenou que os homens Hererós capturados fossem executados, as mulheres e as crianças seriam empurrados para o deserto.
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Bernhard von  Bülow
 
O governador civil Theodor Leutwein não concordando com as atitudes de Trotha queixou-se ao Chanceler alemão Bernhard von  Bülow dizendo que as ações de Trotha iriam arruinar qualquer chance de um assentamento e que ele invadira a jurisdição civil colonial.
 
Sem ter autoridade sobre os militares, o chanceler só podia aconselhar o Kaiser Guilherme II e foi o que fez, disse ao Kaiser que:
“…as ações de Trotha eram contrárias ao princípio cristão e humanitário, economicamente devastador e prejudicial para a reputação internacional da Alemanha…"
 
Talvez esquecendo que estavam em pleno século XX as autoridades tanto coloniais (na Namíbia) quanto imperiais na Alemanha não tomaram conhecimento dos protestos de Leutwein e dos conselhos de Bülow. As atrocidades cometidas pelos alemães chegaram ao conhecimento mundial através de rádios e jornais escritos e é claro foram muito criticados pela comunidade internacional.
 
A Alemanha se defendeu com a seguinte declaração:
 
“…Os Hererós não podem ser protegidos pela Convenção de Genebra que define os direitos humanos, porque a Alemanha afirma que os Hererós não são humanos de verdade, mas subumanos…” (sic)
 
Em 8 de dezembro de 1904, depois de protestos internacionais e de uma batalha politica entre o governo civil, a casa imperial alemã e os militares, o Kaiser Guilherme II revogou o decreto de Trotha de 2 de outubro. Foi inútil; desde outubro os massacres já haviam começado.
 
Os prisioneiros já eram amontoados em campos de concentração e/ou dados como escravos às empresas alemãs na Namíbia. Muitos prisioneiros morreram de desnutrição e fadiga (excesso de trabalho).
herero2 escravizados
Hererós Escravizados
 
A revogação do decreto de Trotha pelo Kaiser impedia a execução sumária dos hererós, mas nada impedia que eles fossem feitos prisioneiros de guerra.
 
herers mortos
Enforcamentos sumários
 
Os Campos de Concentração:
 
Os sobreviventes hererós, a maioria mulheres e crianças, acabaram sendo postos em campos de concentração, como o em Shark Island. Foi o primeiro Campo de Extermínio do mundo.
 
Sharkisland_Camp
Acampamento de "Prisioneiros de Guerra"
Observe que ao menos um está acorrentado pelo pescoço
 
Nesses campos, os Hererós e os Namaquas  foram aprisionados e escravizados; milhares trabalharam até a morte. As mulheres foram estupradas, quem não morria era espancado (inclusive mulheres e crianças) pelos guardas alemães dos campos de concentração. Enforcamentos eram feitos seguidamente sem necessidade de nenhum motivo especial.
 
enforcamento
Os enforcamentos podiam acontecer sem motivo algum
 
Como podemos ver, a infâmia alemã começou muito antes de Adolf Hitler, o Partido Nazista ou o Nacional Socialismo Alemão (nesta época Hitler tinha algo como 15 anos de idade).
 
Herero morrendo
Povo Hereró em Campo de Extermínio Alemão
 
Existiram vários Campos de Concentração na Namíbia, mas o mais infame e cruel deles foi o chamado de Campo de Shark Island (Ilha do Tubarão).
 
Herero Concentration Camps 02
Estas são as "cabanas" no Campo de Extermínio da Ilha Shark
gewaldJanBart
Jan-Bart Gewald
 
Segundo o Dr. Jan-Bart Gewald, professor da Universidade de Leiden na Holanda afirma:
 
“… O Campo da Ilha Shark foi criado com o objetivo expresso de matar pessoas…”
 
 
“… Todo mundo sabia que aquelas pessoas iriam morrer; as pessoas sabiam, os oficiais alemães sabiam. Se eu fosse usar a linguagem do período nazista, então com certeza eu iria ver a Ilha Shark como um campo de extermínio…”
 
“… Os genocídios na Namíbia que ocorreram entre 1904 e 1909 (este ano carece de confirmação, encontrei outras fontes que dizem que os massacres terminaram em 1908 n.a), foram os precursores do que acontece mais tarde durante o período nazista, são os precursores, tem os mesmos “sintomas” no sentido que se pode ver a burocratização dos assassinatos em massa, e isso para mim é o ponto central. Não é matar por matar não, é uma combinação entre matança e burocracia…”
 
Jan-Bart Gewald também escreveu:
 
“…os alemães montaram acampamentos especiais para suas tropas, e muitas crianças nasceram de pais alemães e mães Hererós. Depois que a maioria dos homens hererós foram mortos, as mulheres sobreviventes foram forçadas a servir como prostitutas para os alemães. Trotha se opôs ao contato entre nativos e colonos, acreditando que a insurreição era "o início de uma luta racial" e temendo que os colonos seriam infectados por doenças de origem nativa…”
 
Larissa Frster
Larissa Förster
Larissa Förster, uma especialista na Namíbia, do Museu de Etnologia da Cidade de Colónia na Alemanha, explica:
 
"…Foi claramente um comando para eliminar as pessoas pertencentes a um grupo étnico específico e só porque eles eram parte deste grupo étnico…"
 
Neste Campo de Extermínio da Ilha Shark na Namíbia, cerca de 3.500 seres humanos foram exterminados pelos alemães com velocidade e eficiência própria dos alemães.
 
As autoridades alemãs civis ou militares deram um número a cada Hereró e detalhadamente registraram cada morte, incluindo mesmo o nome de cada pessoa morta nos seus relatórios seja nos campos de trabalhos forçados, seja nos campos de extermínio. Empresas alemãs alugavam hererós como escravos, e a morte dos trabalhadores eram autorizadas pelas autoridades coloniais, e eram notificadas às autoridades alemãs na Europa. Trabalhos forçados, doenças, e a desnutrição mataram um número entre de 50 a 80% da população Hereró até meados de 1908, quando os campos foram fechados.
 
Relatório oficial sobre os campos de 1908, informou que 45,2% de todos os prisioneiros mantidos em cinco campos morreram. Os prisioneiros eram confinados por cercas de arame farpado e as pessoas eram geralmente amontoadas em pequenas áreas. O campo de Windhoek tinha cerca de 5.000 “prisioneiros de guerra” em 1906. As rações eram ínfimas, consistindo de uma mão de arroz cru, um pouco de sal e água. O arroz era desconhecido pelos Hererós e Namaquas e sua inclusão na dieta do campo pode ter contribuído para a elevada taxa de mortalidade.
 
As doenças nos campos de concentração e extermínio eram mais um motivo de mortandade, assim como uma alta concentração de pessoas em uma pequena área contribuíram para a propagação de doenças como febre tifoide, que em seguida se espalhou rapidamente. Não havia atendimento médico, os alojamentos eram  insalubres, os prisioneiros vestiam trapos.

Os Sjamboks:

sjambok
Sjambok
 
Sjambok significa "vara", em Ndebeleo (idioma Bantu africano) é uma arma feita de madeira rígida e resistente, com cerca de 50 centímetros e com uma alça de couro em uma das extremidades. O sjambok mais tarde se tornou o símbolo da Polícia do Apartheid na África do Sul, que caçava os não-brancos. Antigamente (creio que não é mais usado em nenhum lugar do mudo) era usado um instrumento similar para chicotear os cavalos.
 
Esta coisa abjeta, que só covardes e insanos poderiam pensar em usar, era usado em espancamentos e abusos (sexuais) e eram rotina na vida nos campos de extermínio na Namíbia.
 
NAMIBIA SLAVERY
Escravos Século XX
 
Em 28 de setembro de 1905 em matéria publicada no jornal Sul-Africano Cape Argus noticiou detalhadamente alguns abusos, com o título:
 
"No Sudoeste Africano Alemão: novas alegações surpreendentes: horrível crueldade"
Em uma entrevista com Percival Griffith, um sul-africano, que trabalhou como motorista (de transporte de tropas alemãs) no Campo de Lüderitz, relatou suas experiências:
 
"…Há centenas deles, a maioria mulheres e crianças e alguns idosos … quando caem são espancados pelos soldados que estão no comando, com toda a força, até que se levantem … Em uma ocasião eu vi uma mulher carregando uma criança de menos de um ano de idade pendurada em suas costas, e com um pesado saco de grãos na cabeça dela … ela caiu. "O cabo bateu nela com o sjambok por mais de quatro minutos e bateu no bebê também .. . a mulher lutou lentamente para erguer-se até que conseguiu levantar, e continuou carregando sua carga. Ela não emitiu um som o tempo todo, mas o bebê chorava muito…”
 
Fred Cornell, um inglês que mais tarde trabalharia na prospecção de diamantes e que também trabalhou no transporte de tropas alemães, estava em Lüderitz quando o campo de Shark Island estava sendo utilizado. Cornell escreveu sobre o acampamento:
 
"…frio - as noites são frequentemente muito frias lá - fome, sede, exposição a doenças e a loucura reivindicam dezenas de vítimas todos os dias, e vários de seus corpos eram todos os dias carregados até a praia atrás do campo, enterrados em alguns centímetros de areia na maré baixa, e quando a maré atingia os corpos, eles viravam comida para os tubarões…”
Na Wikipédia, existe um trecho que é uma miscelânea de dados, artigos e depoimentos, muito misturados e as vezes com pouco sentido, mas nem por isso inverídicos:
 
“…O campo de concentração de Shark Island, na cidade costeira de Lüderitz, foi o pior dos cinco campos da Namíbia. Lüderitz reside no sul da Namíbia, ladeado pelo deserto e oceano. No porto fica Shark Island, que então era ligada ao continente apenas por um pequeno istmo (ainda é N.A.). A ilha é agora, como era então, estéril e caracteriza-se por rocha sólida esculpida em formações surreais pelos rígidos ventos do oceano. O acampamento foi colocado no extremo da ilha relativamente pequena, onde os presos teriam sofrido exposição completa para os fortes ventos que varrem Lüderitz na maior parte do ano. Os primeiros presos a chegar foram, de acordo com um missionário chamado Kuhlman, 487 Hererós condenados a trabalhar na estrada de ferro entre Lüderitz e Kubub. Em outubro de 1905 Kuhlman relatou as condições desumanas e a elevada taxa de mortalidade entre os Hererós na ilha. Ao longo de 1906 a ilha tinha um fluxo constante de prisioneiros, com 1.790 presos Namaquas chegando em 9 de setembro sozinhos. No relatório anual de Lüderitz em 1906, um funcionário não identificado afirmou que "o Anjo da Morte" tinha vindo para Shark Island. O Comandante alemão Von Estorff escreveu em um relatório que cerca de 1.700 prisioneiros tinham morrido em Abril de 1907, 1203 deles Namaquas. Em dezembro de 1906, quatro meses após sua chegada, morreram 291 Namaquas (uma taxa de mais de nove pessoas por dia). Relatórios de missionários colocaram a taxa de mortalidade entre os 12 e 18 por dia, algo como 80% dos presos enviados para o campo de concentração de Shark Island nunca saíram da ilha…” (sic)
 
Em 1905 foi realizada uma contagem feita por alemães que revelou que 25.000 Hererós estavam vivos na África do Sudoeste Alemão.
 
Alguns hererós não tiveram nem mesmo a mínima dignidade após a morte; seus restos mortais viraram matéria prima para os estudos da “ciência racial” na Europa. Seus crânios e até mesmo as cabeças cortadas foram vendidos para museus europeus e usados para provar a inferioridade dos africanos. O aviltante comercio de crânios dos hererós foi tão comum que foi até motivo em cartões postais da época.
 
Shark Island - Death Camp - BBC
Cabeças de Hererós foram expostas em Museus Alemães
 
Depois do genocídio, os cientistas alemães continuaram a usar a Namíbia como laboratório de campo e os pouquíssimos sobreviventes como cobaias.
Eugen-Fischer
Eugen Fischer
 
Em 1908 um “cientista” eugênico chamado Eugen Fischer, (a palavra eugenia nada tem a ver com o nome Eugenio ou Eugen) viajou para a cidade de Rehoboth na Namíbia. Fischer e um punhado de assistentes passaram meses fotografando, medindo e examinando os habitantes de Rehoboth. Todas as pesquisas de Eugen Fischer estão arquivadas em uma repartição pública na Namíbia até hoje: Fotos, medidas de rostos e crânios e ainda páginas e mais páginas de estudos racistas querendo provar a inferioridade do povo negro africano e que se miscigenando o homem branco com o povo negro africano o gene africano negro irá prevalecer e o resultado será, por mais branco que seja um ser humano inferior.

Após esses estudos, a reputação de Eugen Fischer foi as alturas e o país que mais gostou, adotou e financiou muitas de suas ideias e teorias foi os Estados Unidos.

Em 1985 as Nações Unidas através de um relatório chamado Relatório Whitaker admitiu que cerca de 65.000 Hererós (80% da população Hereró total) e 10.000 Namaquas (50% da população total Namaqua) foram mortos entre 1904 e 1907.
 
Em 1998, o então presidente alemão Roman Herzog visitou a Namíbia e se encontrou com líderes Hererós. O Chefe Munjuku Nguvauva exigiu um pedido público de desculpas e uma indenização pelos crimes ocorridos no início do século. Herzog lamentou, só isso; nem chegou perto de um pedido de desculpas formal. Ele também comentou à época que indenizações, estavam fora de questão.
 
Em 2001, os hererós entraram com um processo nos Estados Unidos exigindo indenizações do governo alemão e do Deutsche Bank, que financiou o governo alemão e as empresas na Namíbia no início do século passado.
 
Em 16 de agosto de 2004, no aniversário de 100 anos do início do genocídio, a então ministra do desenvolvimento da Alemanha Heidemarie Wieczorek-Zeul, pediu desculpas oficialmente pela primeira vez e manifestou pesar sobre o genocídio cometido pelos alemães. E declarou:
 
"Nós, alemães, aceitamos a nossa responsabilidade moral e histórica e a culpa pelos atos realizados pelos alemães na época." (sic)
 
Ela também admitiu que os massacres foram “…equivalentes a um genocídio…”, mas não falou sobre os temas: campos de concentração e escravidão, mesmo ambos tendo sido muito bem documentados pelos próprios alemães. Além disso, ela excluiu o pagamento de uma compensação especial.
 
Em outubro de 2007 os descendentes do General Lothar von Trotha e da família von Trotha viajaram para Omaruru na Namíbia a convite dos chefes Hererós e se desculparam publicamente pelos atos de seus antepassados. Wolf-Thilo von Trotha declarou publicamente:
 
"…Nós, da família von Trotha, estamos profundamente envergonhados dos terríveis acontecimentos que tiveram lugar há 100 anos. Os direitos humanos foram grosseiramente abusados naquela época… " (sic)
 
Em agosto de 2008, após a exibição na Europa de um documentário da TV Alemã que dizia que seus pesquisadores haviam encontrado mais de 40 crânios em duas universidades alemãs, entre elas, provavelmente, o crânio de um chefe Namaqua falecido em Shark Island, perto de Lüderitz; o ex-embaixador da Namíbia para a Alemanha, Peter Katjavivi exigiu que os crânios de prisioneiros hererós e namaquas das revoltas de 1904 a 1908, que foram levados para a Alemanha para a “investigação científica” e "provar" a superioridade dos brancos europeus sobre os africanos, fossem devolvidos à Namíbia.
 
esqueletos de herers
Ossadas dos Hererós reveladas pela ação dos ventos na Ilha Shark
 
Hoje, a Ilha Shark é um acampamento para turistas. Os hererós que morreram congelados ou de sede neste local quase foram apagados da lembrança. Por uma questão climática qualquer, ventos sopraram para longe as areias que cobriam uma quantidade enorme de ossadas, revelando assim o local de suas mortes horrendas. Isso, reascendeu a questão dos hererós. É como se os espíritos destes heróis Hererós não descansassem, e através de seus ossos, ainda clamassem por dignidade.

26 comentários:

  1. Muito massante esse assunto em questão, mencionado acima, quando estamos em época de Natal, tempo de Paz e Confraternização!! Beijos, querido amigo!! Espero que não pense que é pessoal!! Você é um homem sensível e deveria falar de vida sustentável, não de genocídio, assunto cruel que corta o coração e não vale a pena ser lembrado!! Beijinhos!!

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    1. Eu também penso o contrário. Esse povo e esse genocídio, como todos os outros, devem ser lembrados para que a vida dessas pessoas que morreram lutando ou protegendo sua família, como pais e mães que sabiam que iam morrer e ficavam até a morte junto de seus filhos, não sejam menosprezadas. E se tu queres reclamar desse texto, então que não o leia e continue ignorante. Parabéns pelo texto, O Rescator

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    2. Obrigado por seu incentivo e por participar do Blog O Rescator!
      Volte Sempre! Paz!

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  2. Olá Obrigado por participar do Blog O Rescator!
    Eu penso exatamente ao contrário de vossa senhoria; lamento.

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  3. OLÁ GRANDE JORGE.
    COMO NINGUÉM MOSTRA A REALIDADE DO MUNDO, VC COM TODA DIGNIDADE, TRAZ A VERDADE OCULTA. MILHÕES DE PESSOAS DESCONHECEM FATOS CRISTALINOS COMO ESSES.
    PARABÉNS E CONTINUE NOS BRINDANDO COM SUAS MATÉRIAS.
    ABS DO BETO.

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    1. Beto, é bom saber que existem pessoas como você que sem a hipocrisia das datas e dos tempos ajuda a resgatar a dignidade de todo um povo massacrado durante vários natais e semanas santas. Enquanto existirem pessoas como você, o mundo ainda terá um dia a chance de se arrepender.
      Muito obrigado.
      O Rescator.

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  4. OLÁ GRANDE JORGE.
    PRECISAMOS DE MAIS MATÉRIA COMO ESSA.
    PARABÉNS E CONTINUE NOS BRINDANDO COM SUA INTELIGÊNCIA.
    ABS DO BETO.

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    1. Obrigado Beto.
      Suas palavras são sempre um incentivo a continuar.

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  5. OLÁ GRANDE JORGE.
    COMO NINGUÉM MOSTRA A REALIDADE DO MUNDO, VC COM TODA DIGNIDADE, TRAZ A VERDADE OCULTA. MILHÕES DE PESSOAS DESCONHECEM FATOS CRISTALINOS COMO ESSES.
    PARABÉNS E CONTINUE NOS BRINDANDO COM SUAS MATÉRIAS.
    ABS DO BETO.

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    1. Obrigado Beto.
      Ainda existem pessoas disposta a conhecer a verdade.
      "...Conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará..."
      O Rescator.

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  6. Infelizmente aconteceu, acontece e acontecerá bárbaries como essa! Abraços Taisa

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    1. GRANDE JORGE.
      FIQUEI MAIS RICO HOJE.
      NESTE NATAL DESEJO PRA VC E FAMÍLIA, MUIIIITA SAÚDE,PAZ, AMOR E QUE CONTINUES NOS ENRIQUECENDO COM SUAS MATÉRIAS.

      ABS DO BETO.

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    2. Olá Taisa!
      Obrigado por participar do Blog O Rescator.
      Aconteceu é verdade, mas cabe a nós que não aconteça mais. Denunciando e divulgando ao máximo a denuncia.
      Um Abraço.
      O Rescator.

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    3. Beto, eu é que me enriqueci ao ter você como um leitor e incentivador deste trabalho.
      Muito Obrigado.
      Feliz Natal a você e a todos os seus.
      O Rescator.

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  8. Parabéns pela postagem. Brilhante e esclarecdoer trabalho. Cada vez mais tenho lido seu blog. Infelizmente fico estarrecido com os desatinos causados por seres humanos aos seus semelhantes em nome de uma suposta superioridade racial.

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  9. Parabéns. O
    muito bom, precisamos sim buscar e resgatar toda história quase esquecida.

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    1. Muito Obrigado Luciene Cunha!
      Volte sempre ao Blog o Rescator! Paz!

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  10. nao muito diferente do que os portugueses fizeram com os índios e ninguém fala em um "racismo português"

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    1. Os Portugueses cometeram várias atrocidades com os índios brasileiros, porém nada, absolutamente nada nem de perto parecido com isso.

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  11. Parabens pela postagem! Afirma-se que o genocidio armenio (com inicio oficial em 24 de abril de 1915, na atual Turquia) foi o primeiro genocidio do século XX mas na realidade não foi! Salvo melhor juízo, o massacre dos hereros e dos nama foi o 1º genocídio do século XX.
    Também é esclarecedor notar que em 3 genocídios perpetrados no século XX, o exército e governo alemão estão envolvidos: No da Namíbia, no início do século XX, no dos armênios, assírios e gregos critãos que habitam a peninsula da Anatólia no início do século XX (o governo alemão era aliado do exército otomano na I Grande Guerra e forneceu apoio humano, logístico e tecnico, além de se fazer surdo aos protestos de seus proprios embaixadores e consules estacionados em Constantinopla e demais cidades da Anatólia e testemunhas oculares do massacre dos armênios) e durante o holocausto ocorrido durante a II Grande Guerra...
    O próprio Hitler tinha certeza da impunidade quando, ao ordenar o massacre de civis poloneses em 1939, perguntou a seus ouvintes: "Quem ainda se lembra do massacre dos armênios?
    Infelizmente massacres continuam acontecendo na Síria, Iraque, Darfur, Sudão do Sul e a comunidade internacional continua inerte!
    A vida humana é a coisa mais preciosa neste mundo mas também é a coisa mais trivial e sem valor para os grandes líderes e ditadores deste mundo...
    Abraços e continue com suas pesquisas pois "O silêncio dos honestos aprova a maldade dos impios"...

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    Respostas
    1. Muito apropriado suas considerações. Agradeço muitíssimo sua participação aqui no blog O Rescator, pretendo transformar meus artigos sobre genocídios em um livro.
      Muito Obrigado e volte sempre!
      Paz!

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  12. Na sua opinião ignorante e realmente racista culpa somente os alemães de praticarem genocídios, sendo que todos os paises colonizadores os cometeram, ate mesmo em escala muito maiores, um exenplo foram os portugueses com os indios que você mesmo logo acima negou. E eu nem vou citar os genocídios da igreja católica e outras religiões.
    Haia Safari!

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  13. MARIO TENÓRIO CAVALCANTI23 de maio de 2017 às 20:44

    MUITO BOM. BEM ESCRITO, EXCELENTE.

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  14. Muito bom. Parabéns pelo trabalho de resgate histórico. Estes fatos não são contados, pelo contrário, são ocultados. Parabéns"

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